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             O GRUPO SENZALA DE CAPOEIRA

 

No ano de 1962, um grupo de jovens, amantes da capoeira, treinava no terraço do prédio onde moravam Paulo e Rafael, no bairro de Laranjeiras, zona sul do rio. Paulo, que havia treinado capoeira em Salvador, com Mestre Bimba, era quem comandava os treinamentos. Não era um professor de capoeira, com longa experiência, mas ensinava o que sabia. Até então, eu não conhecia ainda esse grupo. Comecei capoeira na Lapa, bairro onde morava, no centro do Rio de Janeiro. Um amigo de nome Paulo Brasil, treinava capoeira com o professor de judô, Rudholf Hermany na Escola de Educação Física da UFRJ, na época, Universidade do Brasil.

Hermany era campeão de judô, mas também era amante da capoeira e o estilo que praticava, era chamado: capoeira de sinhô, do Mestre Sinhozinho. Paulo Brasil era meu amigo, um pouco mais velho, mas andávamos juntos, e um dia, indo à praia do Flamengo, paramos no meio do caminho para que ele me mostrasse alguns movimentos de capoeira, porque eu nunca tinha visto. Logo em seguida à sua demonstração, aproximou-se um negro, magro, com uma camisa de mangas compridas e nos chamou de playboys e gentilmente perguntou se éramos praticantes de capoeira; ele se apresentou como um ex-aluno de Mestre Maré, de Salvador, e nos disse que seu apelido era “Bôca“. Daí em diante, entrei de cabeça nos treinamentos com o Bôca, alí mesmo, nos gramados do Aterro do Flamengo. Com ele aprendí a tocar berimbau e a cantar algumas cantigas de capoeira e a cada dia, me interessava mais naquela arte, para mim, até então, desconhecida. Passados 3 meses, o Bôca prometeu levar-nos, a mim e ao Paulo Brasil, em um local onde uns playboys (como ele tratava os garotos brancos) treinavam capoeira.

Chegamos ao extinto Teatro Jovem, no bairro de Botafogo, zona sul da cidade. Lá havia um grupo de garotos, os mesmos que treinavam no terraço, dos quais os que mais se destacaram foram: Gato, Gil, Preguiça e os irmãos, Rafael e Paulo. Fomos super bem recebidos, até porque, nenhum deles tocava berimbau, e quando viram o berimbau nas minhas mãos, ficaram certos de que algo iria mudar dalí em diante. Eles treinavam com um disco do Mestre Bimba, e assim foi a minha chegada ao Grupo Senzala, que nessa época ainda não tinha sido batizado com esse nome “mas já existia”. Passei a frequentar o Teatro Jovem e dalí nos mudamos para a Rua Benjamim Constant, para um pequeno clube que nos emprestava uma sala.

Ficamos pouco tempo e dalí fomos para a Associação Maranhense, no Largo do Machado, também zona sul da cidade. Lá, conhecemos o Maranhão, professor de judô, que passou a integrar o grupo, como cantador, com sua bela voz, e também como tocador de berimbaus.

Passados alguns meses, nos mudamos mais uma vez, desta feita para a Fundação Getulio Vargas, (uma faculdade) onde tínhamos um esquema de dar aulas para quem quisesse, em troca de uma pequena mensalidade. Em 1964, fui à Brasília visitar meu irmão que morava lá; em visita a uma academia de judô, fui recebido pelo professor, de nome Miúra, que me perguntou se eu estava interessado em aprender judô, ao que lhe respondi negativamente, pois treinava capoeira e foi aí que ele me apresentou ao seu aluno, na época faixa verde, de nome Claudio Brasília, outro apaixonado por capoeira e que também treinava com um grupo de amigos. No dia seguinte, marcamos um treino, e lá conheci o Hélio Tabosa, pessoa que mais tarde veio a integrar o nosso grupo sendo o representante em Brasília do Grupo Senzala. Quando em sua vinda ao Rio de Janeiro pelas férias de fim de ano, Claudio e eu nos encontramos várias vezes e quando chegou a sua hora de voltar à Brasilia, Claudio me apresentou ao Marcelo (hoje Peixinho, apelido dado por mim) e me pediu que continuasse com os seus treinamentos já que ele era muito interessado. Assim, ganhei mais um companheiro de treinos, pois o Peixinho passou a participar dos treinos que eu fazia com o Bôca e também o levei para o grupo. Claudio e eu sempre nos demos super bem, nos tratávamos como irmãos e na segunda viagem que fez ao Rio de Janeiro, levei-o para conhecer o grupo que mais uma vez havia se mudado, desta vez para o bairro do Cosme Velho, e nossa academia passou a ser um salão de festas, na casa de um amigo, de nome Helinho e o Claudio também passou a fazer parte do grupo. O grupo visitava frequentemente as academias dos suburbios, onde ganhamos experiência e também respeito dos outros capoeiristas. Aprendemos muito com esses velhos mestres, que sempre nos receberam de braços abertos, entre eles, devo ressaltar o nome do Mestre Arthur Emídio. Em 1965, fizemos a nossa primeira exibição de capoeira, foi no Clube Germania, em Botafogo, e o apresentador da festa nos perguntou o nome do grupo, pois ele nos apresentaria pelo nome, e foi ai que surgiu o nome Grupo Senzala, de improviso. Fizemos vários treinos também no terraço, onde participavam o Garrincha e o Sorriso, que eram bem meninos.

Em 1967, fomos convidados a participar de um evento que seria realizado no dia 20 de junho chamado: Berimbau de Ouro, na Feira da Providência, que na época era feita em volta da Lagoa Rodrigo de Freitas. Era uma exibição de grupos, e cada grupo também deveria mostrar uma dupla que jogaria 6 minutos sem parar. A comissão julgadora era composta por um grupo de senhores da Associação dos Amigos do Folclore. Ganhamos esse troféu três vezes consecutivas, ficando com ele definitivamente. Troféu este que anos mais tarde foi furtado pelo "Preguiça”, que o levou na ocasião de sua mudança para os Estados Unidos e usou-o falsamente para se apresentar como campeão de capoeira do Brasil.

Em 1968, conhecemos o Nestor, que estudava na faculdade de engenharia e foi trazido pelo Gato, que também estudava lá. Nestor havia sido aluno de Mestre Leopoldina; ainda em 1968, seis anos depois da formação do grupo,chegou o Augusto (Baiano Anzol). Baiano Anzol havia sido aluno de Mestre Bimba, mas não cantava, não tocava nenhum instrumento e assim não acrescentando nada ao Grupo Senzala. Escreveu um livro, com várias fotos de capoeira, utilizando na época um aluno meu, de nome Angelo Gabriel, o Biel. Em 1971, nos mudamos mais uma vez, desta feita, para a Associação dos Servidores Civis do Brasil, em Botafogo.

O Grupo Senzala já era conhecido nacionalmente e também muito respeitado, até porque não tínhamos um mestre, uma pessoa que nos orientasse, aprendíamos uns com os outros, aproveitando a ida de alguns a Salvador, que voltavam com informações valiosas e também dos Mestres da Bahia que em visita ao Rio de Janeiro nos davam apoio, no caso, devo citar o nome do Mestre Camisa Roxa, que ao meu ver, foi o que mais nos ajudou e também do Mestre Itapoã, que nos ensinou a dança do maculelê. Em 1973, 11 anos depois da formação do Grupo Senzala, a pedido do Mestre Camisa Roxa, recebemos seu irmão, o Camisinha (hoje Mestre Camisa).

Camisinha tinha feito o curso de formação na academia de Mestre Bimba, que segundo Mestre Itapoã, tem a duração de aproximadamente, cinco meses; tinha 16 anos de idade quando ingressou no Grupo Senzala. Camisinha ficou no Grupo Senzala 18 anos, depois saiu e formou seu próprio grupo, o Abadá Capoeira. O Grupo Senzala, por não ter tido um mestre, uma pessoa central que direcionasse os treinos, acabou, com o que aprendeu com os mestres do subúrbio e o que aprendeu com os mestres baianos que vinham ao Rio de Janeiro, criando um estilo próprio, que não é Angola nem Regional, é o que chamamos: Capoeira da Senzala, estilo que é utilizado por vários grupos do Brasil, eficiente, técnico e rigoroso.

Apesar de existir há tanto tempo, o grupo só tem 14 cordas vermelhas, graduação máxima no Grupo Senzala. O Grupo Senzala está entre os maiores grupos do mundo, levando em conta que alguns grupos, entre eles o “Abadá” e o “Capoeira Brasil” se formaram com mestres que saíram do Grupo Senzala. A maioria dos seus mestres têm curso superior. É frequente, ler em entrevistas de revistas de capoeira, algum mestre de outro grupo, dizer com todo orgulho: “já fui do Grupo Senzala“ e é também isso que nos faz acreditar, que todo o esforço valeu a pena.

FONTE: www.capoeirasenzala.net - Mestre Itamar

“Alguns jovens sem ter um rumo na vida, mas tendo dentro de si em seus corações e almas a paixão de uma cultura e a defesa de um ideal, algo que antes poderia não passar só de uma brincadeira em um terraço hoje em dia transformou o nosso Brasil, deixou-o mais bonito, deixou nas mãos dos brasileiros o poder de cultivar sua cultura, para o Brasil e para o mundo, um povo sem cultura não vive e a Capoeira é a cara do Brasil como o Brasil é a cara da Capoeira!!”

 

http://gruposenzalacuritiba.com/FONTE:

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